mergulhem-se

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

O Mar, John Banville, Romance..

Banville escreve com clareza, embora o conteúdo pareça sempre uma espécie de mormaço. E embora a escrita se alterne no tempo e espaço, é fácil de captar, nada se parece com Faulkner neste ponto (que aí sim, é um verdadeiro sargaço). Talvez seja a melancolia do livro que me faça sentir isso - este mormaço, talvez marasmo. Achei estranho no começo, simples demais, infantil e chato, depois fui absorvendo melhor (muitas vezes a chatice vem de mim, é claro). Mas não é nada mecânico - como se poderia dizer de Ian McEwan, que ninguém me ouça.

Alors, a história inicia quando Max Modern, retorna à praia de sua infância logo após ficar viúvo. A narrativa se alterna com este presente; as lembranças de criança e de uma família que costumava passar as férias ali; e toda a fase durante a doença de sua mulher. Gosto quando ele vai se aproximando da morte, incrível, porque parece que é quando o texto é mais genuíno, de resto, às vezes - contraditóriamente - parece sem vida. A última parte do livro é muito bonita e muito bem escrita, como quem escreve do estômago - é o que sinto falta no primeiro terço. A própria relação dele com a morte e com a indiferença... e eminentemente com a vida e o que poderia ter sido feito ou o que poderá ser feito, aún, dela. A enfim relação com o mar que é apontada nas últimas páginas, lindo. Isso tudo é o mais valioso do livro. As lembranças da infância ficam insossas perto da relação descrita com a sua mulher, depois ganham mais tônus. Eu não sei, realmente. É bonito. Tem partes bonitas, apesar de outras monotonias, e acho que algumas frases justificam a existência de um livro - ocorreu para mim com este. Mas demora.


‎"Ela está alojada em mim como uma faca e, mesmo assim, estou começando a esquecê-la" o personagem Max Morden sobre a mulher, Anna.


O Mar
John Banville
Ed. Nova Fronteira
222 páginas



John Banville (1945) é um escritor irlandês.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Canção, Allen Ginsberg, poema..






















O peso do mundo
é o amor.
Sob o fardo
da solidão,
sob o fardo
da insatisfação

o peso
o peso que carregamos
é o amor.

Quem poderia negá-lo?
Em sonhos
nos toca
o corpo,
em pensamentos
constrói
um milagre,
na imaginação
aflige-se
até tornar-se
humano -

sai para fora do coração
ardendo de pureza -

pois o fardo da vida
é o amor,

mas nós carregamos o peso
cansados
e assim temos que descansar
nos braços do amor
finalmente
temos que descansar nos braços
do amor.

Nenhum descanso
sem amor,
nenhum sono
sem sonhos
de amor -
quer esteja eu louco ou frio,
obcecado por anjos
ou por máquinas,
o último desejo
é o amor
- não pode ser amargo
não pode ser negado
não pode ser contigo
quando negado:

o peso é demasiado
- deve dar-se
sem nada de volta
assim como o pensamento
é dado
na solidão
em toda a excelência
do seu excesso.

Os corpos quentes
brilham juntos
na escuridão,
a mão se move
para o centro
da carne,
a pele treme
na felicidade
e a alma sobe
feliz até o olho -

sim, sim,
é isso que
eu queria,
eu sempre quis,
eu sempre quis
voltar
ao corpo
em que nasci.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Assim vivemos agora, Susan Sontag, Novela..

(Susan Sontag)






















"Assim vivemos agora" parece escrito em uma só sentada, inspiração, expiração e fim. Pequeno e quase sem pausas. Parágrafos contínuos. Inúmeros personagens comentam sobre o amigo que está na cama de um hospital depois de contrair e se manifestar o HIV. A voz do paciente nunca aparece a não ser parafraseado por outras vozes, "disseram que ele disse", e nesse diz-que-diz se passam todas as conversas, entre vírgulas infindáveis, parece que vamos perder o ar e o livro acaba.

Como lidar com a gradual morte de um amigo, de uma doença que não se sabe quase nada e a expectativa de que a partir de agora pode ser qualquer um de nós. É para ler de uma só vez, do jeito como foi escrito. Às vozes ficam tão próximas nessa espécie de transe lingüístico que parecem pessoas cochichando ao seu lado e você não consegue distinguir exatamente quem está falando. É muito bonito. Doído. Um dos primeiros registros ficcionais sobre a AIDS.


"Ele disse para Tanya (segundo Greg), quer dizer, se realmente estou doente, o que eu ganho se for ao médico?" p.11

"Bem, todo mundo está preocupado com todo mundo agora, disse Betsy, parece ser assim que vivemos, assim que vivemos agora." p.19

"ele pensava sobre isso, o fim da farra, o fim da loucura, o fim da vida confiante, o fim de ver a vida como uma coisa garantida e de tratar a vida como algo que, feito um samurai, se considerasse disposto a jogar fora de coração leve, despudoradamente;" p.42

"E ele disse certa manhã para Quentin, o medo me rasga, me abre; e para Ira, ele me aperta, me espreme em direção a mim mesmo. O medo tinge, euforiza todas as coisas." p.47/48


Assim Vivemos Agora
Susan Sontag
Tradução de Caio Fernando Abreu
Ed. Cia das Letras
56 páginas

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

"Baila..." - Isabel Escudero, poema

Baila, niña, baila,
y que se vea el caos
bajo tus faldas.



(enviado porAninha Terra)

sábado, 5 de fevereiro de 2011

" o melhor dos piores...." - Hélio Póvoas Júnior, poesia

o melhor dos piores versos:
terem sido bem engajados
em legítimos recuos (recusas), justas causas

o pior dos melhores poemas:
terem sido bem-nascidos
de amores espúrios (escusos), paixões coibidas



(do livro "PURALIRA", Hélio Póvoas Júnior, Coleção Itiquira Thesaurus)