Buenos Aires, década de 50, com uma pluralidade narrativa imensa, Sabato inicia uma trilha (assustadora) para os porões da loucura, a qual parece ser o personagem principal desse livro. São várias vozes que pertencem ou rodeam de alguma forma a família Olmos, lotada de entes estranhos obsecados por mundos completamente insanos que vão sendo revelados no decorrer da obra. A entrada nestes mundos através das descrições de Sabato nos trás uma veracidade tal que é como se estivessemos dentro dos olhos de cada louco e começamos a questionar o que faz parte da realidade e o que não ou por que o mundo deles seria menos real do que o nosso. A fenomenologia caberia bem aqui. Pode-se concluir, conforme afirma um dos loucos mais conhecidos do centro manicomial Pinel do Rio de Janeiro que "As portas do hospício estão do avesso".
Não é um livro fácil, não só pelo número de páginas, mas pelo excesso de elementos históricos, personagens, vozes etc contidas no texto. Muitas vezes durante a leitura acabei pensando que Sabato poderia excluir umas 200 páginas e o livro seria o mesmo, mas é claro que esse parece um olhar pobre ou ingenuo demais. Talvez se fosse mais compacto do jeito que eu o imaginava, essa nossa expedição não chegasse tão fundo, no musgo do musgo do musgo como ficamos ao final. Mas é difícil, afinal, nunca é simples emaranhar-se tanto assim, senão no âmago das nossas condições, em mundos cheios de nós mesmos. - e de maneira tão bizarra ou tão cheio de sombras.
Os principais fios narrativos são Alejandra, jovem, que conforme Sabato já nasceu madura, com a velhice por dentro, torturada e caótica; Fernando, homem obsecado pela cegueira, passa sua vida fazendo um relatório sobre a Seita dos Cegos, que aliás preenche um dos 4 capítulos do livro; Martín, jovem apaixonado por Alejandra, enciumado, tímido, obsecado e ao mesmo tempo temeroso da família a qual ela pertence; e o general Juan Lavalle, que tem sua história recontada por flashes narrativos dentro e fora da boca dos personagens, herói da independencia argentina que lutou contra o tirano Rosas e teve que bater em retirada para a Bolívia um século antes de todo o cenário do Romance ser construído.
Sobre heróis e tumbas
Ernesto Sabato
Ed. Cia das Letra
623 páginas
Ernesto Sabato (Rojas, 1911) é um ensaista, escritor e artista plástico argentino. Sobre Heróis e Tumbas foi considerado o melhor romance Argentino do século XX
9 comentários:
Alejandra me tocou em algum ponto. Martín também. Mas Alejandra, especificamente, me lembrou você.
E como sempre arrasando na escolha das fotos!
Sei lá. Acho que falei de um modo que parecesse. Mas a Alejandra é muito estranha. Fiquei com uma espécie de ogeriza dela. Esse livro toda é estranho. Louco (ou sou eu).
humm pelo jeito ler até o final rendeu uma boa surpresa. ;)
Veremos os efeitos colaterais dos próximos dias!!
kkkk vou sumir no msn então nos próximos dias! ;P
É... o jeito que você falou pareceu mesmo, mas só lendo pra saber.
Gosto muito desse livro, apesar de indigesto. Demorei uns bons meses para conseguir terminar de ler a narração do Fernando.
Essa coisa de entrar na viagem de cada personagem sufoca muito. E talvez por isso o livro seja tão bom.
Tenho ele guardado com carinho na minha estante.
É bem indigesto mesmo, ainda tenho um sentimento estranho por ele ("e talvez por isso o livro seja tão bom")
Postar um comentário